quinta-feira, 28 de julho de 2011

O Eu e o Outro
Um dos primeiros desafios que me impus na adolescência foi o de entender a mim mesmo e as pessoas com quem convivia.
Lembro-me de me considerar cheio de defeitos, o que me levava a um sonho recorrente: ter a oportunidade de começar tudo novamente num lugar onde ninguém me conhecesse.
Não gostava da forma como agia, mas estranhamente continuava a fazer as mesmas coisas que me tornavam aquela pessoa a quem eu queria ver renascer como alguém totalmente diferente.
É verdade que ao longo dos anos recomecei algumas vezes, mudei muito e tornei-me muito diferente do que era, no entanto ainda continuo muito longe de conseguir me entender e entender os outros.
Ando desconfiado de que o problema está na perspectiva pela qual tentamos nos conhecer. O fato de nossos olhos estarem voltados para fora e ser a visão o sentido no qual mais confiamos talvez possa explicar porque sempre nos analisamos com base no que está ocorrendo em nosso entorno, quase sempre, estabelecemos uma relação de causa e efeito entre o que ocorre próximo de nós e o que estamos sentindo.
Somos decisivamente afetados pela realidade que nos cerca e de forma mais contundente pelas pessoas que nos cercam, se pudermos tomar essa afirmação como verdadeira, também poderemos considerar verdadeiro que nós afetamos a todos que estão à nossa volta, ou de alguma forma interagindo conosco, e quanto mais próximos estamos de alguém maior é o efeito que causamos.
Quase nunca nos preocupamos com isso a ponto de orientarmos a nossa conduta de forma a minimizar ou evitar os desconfortos inerentes ao convívio entre as pessoas.
Quantos sofrimentos nós causamos aos outros sem sequer perceber que os tenhamos causado, é comum também nos impormos sofrimentos desnecessários, advindos de percepções equivocadas e da insistência em alimentar sentimentos cuja origem desconhecemos e cujo destino só nos conduz a mais sofrimento.
Mas nem tudo é esse mar de angústia, a interação com outras pessoas também pode nos dar prazer e alegria, o problema é que não nos contentamos em viver e aproveitar descansadamente as experiências que a vida nos proporciona, quase sempre dedicamos uma boa parcela do nosso tempo à tentativa de entender o que se passa nos meandros dessas vivências, principalmente no que se refere aos motivos que embalam o outro.
As relações interpessoais desencadeiam uma dinâmica na qual todos procuram, de uma forma, ou de outra usar as pessoas com quem convivem, e como ninguém gosta de sentir-se usado, se estabelece um conflito, no interior de cada um, que raramente explicitamos. Vivemos as nossas angústias em silêncio, o que as tornam mais difíceis de serem suportadas.
Alguém poderia dizer que a solução é simples, basta que se estabeleça o diálogo como ferramenta para minimizar essas angústias, no entanto, efetivar o diálogo não é algo tão simples, a maioria de nós não escuta o que outro diz, na verdade ficamos em silêncio, não para ouvir o outro, mas para aguardar a nossa vez de falar, falamos como se fossemos a única voz que valesse à pena ser ouvida, com isso cultivamos um profundo desconhecimento sobre o outro e suas razões.
Algumas tentativas de entender as pessoas me levaram por vezes a considerações, no mínimo interessantes, uma delas é sobre como usamos a expressão “nossas razões” para nos referirmos aos motivos que nos levam a determinadas atitudes. Não conheço ninguém que se paute exclusivamente pela razão, pelo contrário, o que nos põe em movimento são as emoções ou sentimentos, quase sempre os negativos como o desejo de vingança, o ciúme, a inveja, a intolerância, a desconfiança, o preconceito e o ódio, entre outros. Não quero afirmar que não sintamos coisas boas em relação às outras pessoas, no entanto é mais raro que esses bons sentimentos nos motivem a agir para concretizar, ou até mesmo fazer com que a outra pessoa saiba o que sentimos.
Não falar sobre o que sentimos é por vezes um mecanismo de defesa, o temor de que usem os nossos sentimentos contra nós é algo real e justificado. Eu me lembro de uma amiga que me contou que fazia gato e sapato de um rapaz que confessou estar apaixonado por ela, sempre deixava escapar o que queria ganhar de presente e o rapaz nem esperava uma data especial para lhe comprar o mimo, ele também digitava todos os seus trabalhos de faculdade e ficava todo entusiasmado quando podia fazer algo por sua paixão. Não preciso dizer o quanto esse jovem sofreu.
Penso que o que disse aqui não é novidade para ninguém, fica, no entanto, uma pergunta a ser respondida: como lidar com isso tudo de forma que não soframos e nem façamos os outros sofrerem demasiadamente? Apesar de acreditar que a resposta a esta questão deva ser construída de forma singular e individual posso dizer que tenho conseguido algum progresso empregando uma parcela razoável do meu tempo a análise de mim mesmo, tentando entender como tenho sido afetado pelas pessoas e como eu mesmo tenho afetado elas.

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