terça-feira, 21 de junho de 2011

Cola, onde está o problema:

A cola não é um problema, na verdade ela é um sintoma de uma doença muito mais complexa, chamada embrutecimento.

O embrutecimento como a maioria das doenças graves não é um fenômeno instantâneo, requer anos de maus hábitos cultivados pelas escolas através de uma pedagogia centrada no professor.

É sabido que a capacidade de aprender é, para os seres humanos, uma condição necessária à sobrevivência, toda homem e mulher nascem com um desejo incontrolável de aprender todas as coisas que existem isso, porque necessitamos conhecer o mundo para poder gostar de viver nele, não é mais apenas uma questão de sobrevivência e sim de ter prazer enquanto vivemos.

Aprender é um fenômeno complexo de difícil compreensão, é tão complexo que existem formas diferentes para explicá-lo, no entanto a maioria das atuais teorias a respeito da aprendizagem concorda que a memória desempenha um papel fundamental no processo do desenvolvimento das competências. Conheço pessoas cuja memória é prodigiosa, são capazes de lembrar com fidelidade literal páginas inteiras de texto e fatos ocorridos há muito tempo, confesso que também tenho uma boa memória, lembro-me, por exemplo, de quando ingressei no ensino fundamental, a escola me parecia um lugar mágico. Disseram-me que lá eu iria aprender mais sobre o mundo do que em qualquer outro lugar.

Acho que foi uma das maiores decepções da minha vida, descobri que o mundo que a escola queria me ensinar não era o mesmo mundo que eu queria conhecer, até hoje não consigo entender para que servem um monte de coisas que passaram um tempão tentando me ensinar.

Todo o entusiasmo em relação à escola deu lugar a apatia e a descrença de que o que aprendia lá pudesse me servir de alguma forma para lidar melhor com o mundo a minha volta logo descobriu que os professores me pediam para fazer atividades que eles já traziam prontas de casa e que mais cedo ou mais tarde mostrariam como resolvê-las, e que se eu aguardasse até o professor mostrar a resposta no quadro eu poderia me poupar do esforço, é certo que alguns professores conferiam se eu tinha tentado responder, mas era só fingir e responder de forma superficial que eles se davam por satisfeitos, mesmo porque sempre partiam do pressuposto que os alunos não sabiam nada, quem sabia eram eles e que os alunos deveriam aprender com eles, era para isso que as escolas serviam.

Mas nem tudo era ruim na escola, não consigo esquecer uma professora da quinta série, Theresinha, a grafia do nome era exatamente assim, pelo menos é como me lembro, era professora de português e no início do ano letivo pediu que lêssemos o livro “A Ilha do Tesouro” da coleção Vaga Lume, de início nem passava pela minha cabeça ler o tal livro, mas então Theresinha começou a iniciar suas aulas com a leitura de um texto, e a forma como ela lia parecia que estava contando, do seu jeito, uma fábula que ouvira de alguém, nós nos víamos dentro da história, nos sentíamos como personagens e depois da aula continuávamos a imaginar que fazíamos parte daquele mundo. Foi assim que eu comecei a gostar de ler.

Quanto á cola eu preciso dizer que tentar impedi-la é como dar antitérmico para baixar a febre de uma criança com uma infecção grave e ficar só nisso. É possível que a febre ceda, mas o remédio não terá nenhum efeito em relação à infecção que é o verdadeiro problema.

Enquanto o que se ensina não tiver significado para os alunos e não possibilitar que eles exercitem a capacidade de pensar e de aprender de forma significativa eles sempre estarão buscando meios para fraudar o processo, pois não conseguem enxergar outro objetivo na avaliação que não seja obter uma boa nota, quando deveriam vê-la como um instrumento emancipatório.

Para emancipar um ignorante, é preciso e suficiente que sejamos, nós mesmos, emancipados; isso é, conscientes do verdadeiro poder do espírito humano. (Rancière, p. 34)

Quem ensina sem emancipar, embrutece. E quem emancipa não tem que se preocupar com aquilo que o emancipado deve aprender. Ele aprenderá aquilo que o emancipado deve aprender. Ele aprenderá o que quiser, nada, talvez. (Idem, p. 37 )

Há mais de oito anos eu defendo a avaliação com consulta a todas as fontes disponíveis, acredito que o que deve ser incentivado é a capacidade de resolver problemas, atender demandas e de ser criativo. Na vida fora da escola, pesquisamos na Internet, consultamos especialistas, buscamos nos livros, não vejo porque a escola não possa incorporar os paradigmas da vida contemporânea ao seu dia-a-dia.